Personagem Branca Dias é torturada e julgada, mas não entende a natureza de todas as acusações - Foto: Clarildo Menezes

“Há um mínimo de dignidade que o homem não deve negociar, nem em troca de sol”. A frase sintetiza o espetáculo “Inquérito 5736 – Apenas uma parte da verdade”, apresentado pela Cia de Segunda – Nova Iguaçu/RJ no Cinema Público Municipal Henfil (Centro) na noite da última quarta-feira (26/07). Com apenas 50 minutos de duração, a peça tem direção, sonoplastia e cenografia de Anderson Dias, numa adaptação do texto de Dias Gomes. “Falamos sobre liberdade de expressão de forma atemporal através de uma metáfora criada por Dias Gomes, apesar dele ter situado a ação na Santa Inquisição, no tribunal montado pela igreja para julgar os crimes de heresia dos cristãos”, descreve o diretor. “Entendemos que ela fala sobre a liberdade de expressão seja em 1964 no Brasil, seja hoje com esse movimento político conturbado que o país atravessa”, acrescenta. “Ter a possibilidade de dizer aquilo que a gente pensa sobre todas as questões sejam elas políticas ou econômicas é fundamental. Então é sobre isso que a gente fala, essa liberdade incondicional”, explicou Anderson.

Ao lado dos companheiros de cena, José Brito e Tiago Zandurai, a atriz Ohana Natureza falou sobre a estreia na cidade. “É um prazer estar compartilhando esse trabalho com vocês. Fazer essa estreia do espetáculo com esse teatro lotado numa quarta-feira, fico imensamente agradecida”, disse. “Ainda mais por ser nesse festival que eu acredito muito e classifico como de resistência, porque são vários grupos para fazer acontecer, lutando pela arte. Então é muito importante para mim”, ponderou.

O festival é importante também para quem assiste. Moradora de Jacaroá, Paloma Andrade, 22 anos, falou sobre o acesso dos jovens à cultura. “O festival está trazendo mais cultura para a cidade, permitindo o acesso da juventude ao teatro, que ultimamente não se interessa pela arte”, disse. Acompanhada das amigas, a coordenadora pedagógica Francinete Campos, 57 anos, moradora de Araçatiba, falou sobre a cultura fazer parte da vida do povo. “Sem ela, o povo não é nada. Já não chega a submissão, a subjugação que o povo está perante o poder. Então, enquanto está tendo acesso à cultura, as pessoas estão usando seus cérebros, refletindo, raciocinando, discutindo. Estamos vindo em quase todos os espetáculos e vai para casa discutindo sobre os espetáculos”, pontuou.

Coordenador do Cinema Henfil e da produção cultural, Perceu Silva falou sobre o crescimento teatral nas cidades com a realização do festival. “O crescimento é visível tanto na área de oficinas e cursos de teatro, quanto no surgimento de novos equipamentos públicos, teatros municipais. Foi assim em Rio das Ostras e Cabo Frio, por exemplo”, analisou. “Aqui temos esse espaço maravilhoso. Tivemos mais uma vez a capacidade máxima atingida de público. Então, as pessoas estão realmente criando o hábito de vir ao teatro sem ter que ir para outras cidades, e o melhor que é para assistir espetáculos de qualidade de graça”, finalizou.

No espetáculo, Branca Dias, interpretada por Ohana Natureza, é presa, torturada e julgada com o pai e o noivo, mas não entende a natureza de todas as acusações. “Temos a tendência a colocar as palavras na boca dos outros, a acusar de N coisas e acho que o grande conflito da Branca é esse. Ela não aceita as coisas que colocam pra ela”, afirmou. “E é um pouco do que vivemos nos dias de hoje. Precisamos resistir, não pode ceder, abrir mão do que acredita, do mínimo de dignidade que a gente tem em função de nada”, declarou.

Deixe uma resposta

Please enter your comment!
Please enter your name here